você quer mesmo ser offline ou só quer mostrar que é?
sobre todo esse movimento das pessoas se desconectando (e depois se conectando de novo pra contar como foi inspirador se desconectar)
muitas coisas me irritam nas redes sociais e na internet num todo, o que eu acho bastante normal, saudável até. sabe, não importa o quão zen você seja, tenho certeza que é impossível passar mais de meia hora no instagram, por exemplo, sem se irritar com alguém.
seja com um story de um conhecido lendo café com deus pai logo cedo (não era mais fácil ler, sei lá, a bíblia? ou não é tão aesthetic?) ou com a notícia de que o neymar comeu mais alguém além da sua esposa de novo (que grande novidade menino ney que grande novidade) ou até com aquela psedo blogueira te perguntando no story se você prefere que ela poste um carrossel ou um reels hoje (sendo sincera? eu prefiro que você decida).
ser cronicamente online é pedir pra se irritar pelo menos um pouquinho diariamente e tá tudo bem!!! confia. sou eu que tô dizendo. não se sinta mal por ser meio amargurado. todo mundo é.
agora, algo tem me irritado mais do que qualquer coisa nesses últimos tempos e é sobre isso que a gente vai falar hoje. segure na minha mão e vem comigo.
joy of logging off
você já deve ter notado que o offline é o novo luxo. o chamado JOLO, por exemplo, que é, basicamente, a alegria de se desconectar, é só uma das tendências que nos levam a crer que o movimento offline está apenas começando por aqui.
em entrevista para o globo, um especialista no assunto esclareceu que o JOLO e toda essa obsessão por passar tempo fora das redes não são movimentos anti tecnologia, mas sim de equilíbrio e propósito no uso das telas - o que eu, pessoalmente, acho ótimo.
eu já fiz um texto inteiro falando sobre a minha relação com as redes sociais e como isso tudo me incomoda, ou seja, sou totalmente a favor de qualquer movimento que incentive as pessoas a repensarem sobre seu tempo de tela e transformarem tudo isso numa relação mais saudável (na medida do possível).
o que tem me irritado mesmo nessa coisa toda é a galera que se desconecta da internet por um final de semana e depois fica produzindo conteúdo sobre ser offline por um mês. eu sinto que as pessoas só estão se desconectando pra poder voltar e falar na internet (!!!!!!) sobre isso. só pra mostrar o quanto são evoluídos espiritualmente por serem tãoooooo offlines.
mas será que são tão offlines assim?
você quer mesmo ser offline ou só quer mostrar que é?
quando uma pessoa passa um tempo fora das redes e depois volta do alto do seu pedestal fazendo uma porrada de conteúdo a respeito, com um tom meio “veja como eu sou melhor que todos vocês”, tudo que eu consigo imaginar é que ela ficou os quatro dias que passou sem instagram apenas pensando no que postaria quando voltasse pro instagram.
e é broxante perceber (ou supor) que alguém tá fazendo algo SÓ pra poder se autopromover na internet. nesse caso, especialmente, além de broxante também é bem contraditório.
acho que me irrita também (perceba que estou formulando todo o meu pensamento aqui agora ao vivo) porque essas pessoas agem como se estar offline fosse fácil, simples e apenas uma questão de querer. como se a gente não dependesse do celular pra sobreviver hoje em dia ou como se essa cultura do escapismo não fosse algo intencional, projetado pra ser assim.
esse tipo de conteúdo nos faz acreditar que a culpa de tudo isso é nossa, mas não é (pelo menos não só). é claro que você pode adotar algumas medidas na sua rotina para tornar essa relação um pouco menos doentia, mas não é tão simples como fazem parecer que é. e não é tudo culpa sua.
por esses e outros motivos, estar rolando o feed e me deparar com alguém me dando lição de moral de graça por eu ser uma fodida viciada em tela me deixa descontrolada. afinal, se foi tão bom assim ficar offline, por que é que você não continuou lá no seu mundo sem internet em vez de vir aqui me atordoar?
fique offline (só não me conte isso)
uma outra coisa que me deixa chateada nessa competição de quem é melhor em se desconectar enquanto todos continuam conectados é o esvaziamento de algo que, no fim, é bem legal. porque estar offline é bom d+, não tem como negar. é delicioso quando a gente consegue se dar ao luxo de viver a vida que tá acontecendo na nossa frente. só não é uma coisa fácil, acessível e igual pra todo mundo.
ou seja, eu sou a favor do movimento offline, eu só não sou a favor de você ficar offline e depois vir na internet tentar esfregar na minha cara que você é melhor que eu por isso. porque você não é. eu diria até que é pior. <3
frase da semana ✸
ontem eu tava aproveitando o fim do meu domingo ouvindo uma boa música e tentando não me matar (por motivos de muita ressaca e domingo) e fui agraciada pelos deuses do spotify com uma música que fazia tempo que eu não ouvia que é “depois que a dor passar”, d’o terno.
a frase da semana vem dessa música:
“Mas há por vir
Muita beleza ainda
Você tem toda uma vida
Pra viver o que ainda nem chegou
E se não deu, vai dar
Ou paciência
Nem sempre o que a gente pensa
É realmente o que vai ser melhor.”
um recado
como eu contei na última edição da news, meio que estoy desempregada. por isso, a partir de abril (7), vou passar a incluir a opção de assinatura (no valor de R$5 mensais) aqui no meu substack. alguns textos ainda vão continuar de graça, mas a maioria será só para assinantes, ok? foi a forma que achei de continuar escrevendo agora.
espero que entendam e que me procurem caso tenham alguma dúvida.
obrigada por ter chegado até aqui e até semana que vem.
beijooooo
sinto que existe também uma separação bem clara entre as pessoas que ficam offline criando vídeos motivacionais como: eu fiquei 90 dias sem celular, e aqui estão 10 motivos pra você fazer o mesmo ou usando camisas como “cronicamente offline” e afins, exaltando uma ideia meio “eu sou MTO galera” versus algumas pessoas que ficam offline, mas eventualmente contam sobre isso sem necessariamente trazer pra um pedestal, só numa espécie de: “é possível, me faz bem, mas foda-se porque cada um que vai saber”. sabe?!! e essas eu amo, me faz um bem danado 🤍 amei o texto, ale!
Eu vejo muito disso principalmente aqui no substack. O povo por aqui adora bater no peito e falar que saiu do tiktok ( a irônia é que uma galera por aqui descobriu ESSE app pelo tico e teco) e do instagram, sendo que esse logout foi a meia hora atrás e a pessoa só quer ter esse sentimento de diferença, de ir "contra uma massa cada vez mais viciada em telas".
Tipo, amor, você não fez uma grande revolução. Você não descobriu a cura do Lupús usando um microscópio de 1984 decadente, ou criou uma nova língua do zero, ou inventou a pílula anticoncepcional masculina tendo o orçamento de um guaraná e um big big. Você só excluiu um aplicativo do seu celular. E, spoiler: quando você sentir falta, é só ir na play store e baixar de novo.
Apoio super a pessoa que toma coragem e decide sair de uma rede social que tá fazendo mal pra ela (sai do twitter e, sinceramente? melhorei DEMAIS da cabeça. Sim, se você deslogar do twitter, 90% dos problemas de lá não se projetam na vida real.), mesmo sabendo que vai ser difícil. Agora, a que sai delas pra poder vir aqui no substack ou no youtube (que essas mesmas pessoas tendem a esquecer que TAMBÉM são redes sociais) contar como é evoluida e diferente e culta merece todo choque de realidade e um pouco mais.